Autônomos perdem renda e esperam fim de pandemia

O impacto econômico mundial ainda não pode ser medido, mas algumas áreas estão sendo mais afetadas do que outras. Em Itu, entrevistamos quatro profissionais autônomos que contam sobre o desafio do isolamento social sem ter renda.

 

O comerciante André Zucculim, 40 anos, acorda e vai fazer o café. Na casa de cinco cômodos, ainda impera o silêncio. Em um dia comum, os filhos adolescentes já estariam se preparando para a aula, a esposa já estaria ao seu lado na cozinha. Mas agora todos ainda dormem. Não há o que fazer nem para onde ir.
Pelas grades do portão da garagem, que agora se assemelha a uma prisão, ele olha a rua deserta. A escola em frente à sua casa está fechada. Outras também.
E é justamente em escolas que ele ganha seu sustento: trabalha, ao lado da esposa, das 6 às 22h de segunda a sexta, administrando duas cantinas. No canto da sala, parte do estoque dos alimentos que seriam vendidos nas lanchonetes estão próximos do vencimento.
Ele está acostumado a ficar praticamente sem renda durante as férias, mas essas férias logo em março o deixaram sem planejamento. “Estou me sentindo perdido”, confessa. O prejuízo financeiro é alto e o pegou em meio a uma reforma de sua casa. “Como vamos continuar, se não sabemos como tudo isso vai ficar?”.
Se lembra da frase da Serenidade: “Senhor, conceda-me a serenidade para aceitar aquilo que não posso mudar, a coragem para mudar o que me for possível e a sabedoria para saber discernir entre as duas. Vivendo um dia de cada vez….”

A guia de turismo Luciana Daldon, 37 anos, observa os frutos do seu quintal, no bairro Potiguara. Eles tem seu tempo. É preciso paciência. Ali próximo, sua mala de viagem está vazia. Não há partida nem chegada. Chegada apenas dos boletos: água, luz, IPTU, cartão de crédito. Eles também não tem destino certo, pois a única fonte de renda de Luciana cessou. Não há um plano B.

Vivendo sozinha, ela se preparava para uma rotina sem rotina e com muito trabalho: teatros em São Paulo, acompanhamento de escolas em projetos pedagógicos, roteiros culturais em cidades da região, além de praias e montanhas em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.

Seus territórios foram limitados ao seu quintal. Ela tira selfie, canta, toca violão. Mantem a resiliência, enquanto espera que o Coronavírus termine de carimbar este passaporte e pare com esse roteiro mundial de fazer inveja pra qualquer guia de turismo: já são mais de 170 países.

A promotora de eventos Solange Andreazza, mais conhecida como Sol, é dessas arianas legítimas, que correm atrás, que fazem acontecer. Porém, se vê em um momento de pausa forçada. Respira fundo, segurando a ansiedade de saber que toda sua proatividade agora de pouco vale.

No celular, as notícias criam vida própria. Parecem tentáculos lhes amassando os ossos. Ela sorri, fingindo que está tudo bem. Respira fundo, vai passar. Sempre foi forte, sempre passou. A filha de dez anos se espelha nela. E também aguarda dela a renda para seu sustento.

Essa renda agora está suspensa. Pois além de ser responsável por Elis, ela é responsável por centenas de pessoas que nos últimos anos compareceram aos eventos que promoveu. Todos cancelados, por tempo indeterminado. Dos eventos grandes aos pequenos. Um encontro de mulheres, palestras, eventos culturais e um congressos. Como diria Raul Seixas, que toca em seu play list: “… a terra parou, parou! “Estou apenas home office na pré-produção desses eventos que deverão acontecer apenas no segundo semestre. Até lá, serão meses difíceis, mas é a responsabilidade para com a saúde das pessoas, o resto, quando passar esse momento, porque ele vai passar, a gente corre atrás…”

O ator Juliano Mazurchi, 43 anos, observa seu filho Gael, de 3 anos, brincar no quintal, enquanto sua filha Cora se mexe na barriga da esposa Charlene. No aconchego familiar, ele tenta afastar as dúvidas de tempos tumultuados.

Em cartaz em um teatro em São Paulo e um dos responsáveis pelo Teatro Nósmesmos, em Itu, viu, abruptamente, os eventos serem cancelados. Cortinas fechadas. Escuro. Silêncio. Até quando?

Na cochia, ele observa o desenrolar de um enredo da vida real, onde só lhe resta acreditar em um final feliz.  As aulas também foram suspensas, afinal, se tem algo que aluno de teatro faz é abraçar, beijar, tocar. Agora, toque apenas nos familiares mais próximos.

“Hoje nossa rotina de trabalhado é voltada apenas a produção administrativa. Estamos formulando conteúdos para darmos aulas à distância”, conta. Os prejuízos financeiros ainda não foram contabilizados. “Existe um questão maior envolvida que supera qualquer preocupação financeira: a vida”, conclui, enquanto Cora concorda, dando um chute na barriga da mãe. Cora, mundão louco esse no qual você vai chegar!

(Texto: Rosana Bueno Fotos: Arquivo Pessoal)

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