Dores que não se curam..
Um dependente químico é aquela pessoa que apresenta dependência física e psíquica gerada pelo consumo de substâncias psicoativas. Na maioria das vezes ele busca alívio das suas emoções, sentimentos, dores, frustrações ou situações que foram um gatilho para o início do uso.
Essas pessoas buscam auxílio e conforto umas nas outras, porque o que acontece na maioria das vezes é que elas são marginalizadas pela família, pelos seus amigos mais próximos.
Em São Paulo, a região conhecida como Cracolândia, onde os usuários de crack se reuniam para o consumo da droga, uma área que existe há mais de 30 anos, e recentemente teve seus dependentes expulsos e violentados pela polícia, que estavam atrás de traficantes.
Sem ter para onde ir, a maior parte das pessoas que estavam na praça foi para outro ponto no centro, em busca de outro lugar para se concentrar e armar suas barracas.
O que fica difícil para as pessoas enxergarem ao verem locais assim, é que Cracolândias como essa, normalmente retratam as mazelas da nossa sociedade, porque são pessoas que tiveram suas vidas destruídas, e o problema é muito mais grave do que aparenta ser, exigindo várias formas de intervenção, o que pode ser feito por meio de um programa efetivo de reinserção social, porque o que essas pessoas precisam vai muito mais além de abrigo e comida.
O que acontece é que a concentração dessas pessoas não pode ser atribuída somente ao uso de drogas. A dependência química é o resultado da condição de exclusão social, porque se a situação não for olhada dessa maneira, a pobreza e a miséria que essas pessoas vivem vai ser desconsiderada, criminalizada e minimizada pelo poder público.
O usuário de droga é uma coisa, ele precisa de prevenção. O traficante precisa de repressão e o dependente químico precisa de tratamento. Se todos forem tratados da mesma forma o que vamos continuar vendo são as cenas que vimos alguns dias atrás e o problema não será resolvido e continuará existindo.
Não é só de substâncias psicoativas que as pessoas se viciam. O que temos visto crescer aqui no Brasil é o número de pessoas dependentes de opióides. Depois de causar uma crise de saúde pública nos Estados Unidos, a situação começa a se repetir aqui. Os opióides são remédios analgésicos usados no tratamento de dores crônicas, que geram uma sensação de euforia e bem-estar na pessoa que usa. O que vem acontecendo e tem gerado um alerta é o aumento indiscriminado de prescrições desses narcóticos que podem ser tão ou mais viciantes do que o crack.
Em 2019, uma pesquisa sobre drogas da Fiocruz mostrou que 4,4 milhões de brasileiros fizeram o uso ilegal de algum opiáceo, ou 2,9% da populacão. O número é três vezes superior ao uso de crack, experimentado por 0,9% da população ao longo da vida.
A cada dez pessoas no Brasil, quatro sofrem de alguma dor crônica, aquela que persiste por mais de três meses. São cerca de 80 milhões de pessoas. Uma pesquisa realizada pela Anvisa, mostra que a venda prescrita desse analgésico cresceu 465% em três anos.
A dependência começa porque com o passar do tempo o organismo desenvolve certa tolerância aos opiáceos, assim o paciente precisa de mais comprimidos para sentir o mesmo alívio.
O uso indiscriminado dessa substância gerou uma verdadeira epidemia nos Estado Unidos, onde os médicos que receitavam mais ganhavam viagens e verba para pesquisa. Com esse incentivo, eles passaram a dar oxicodona ( um derivado muito forte da substância) a pacientes muito jovens com problemas simples, como uma torção no pé. Começava assim a maior crise de viciados na história dos Estados Unidos, que em duas décadas tirou a vida de 200 mil pessoas, vítimas de overdose do medicamento. Com o aumento no custo do medicamento nas farmácias surgiram os traficantes. E devido ao seu alto custo, o abuso era mais comum entre anestesistas, enfermeiros e cirurgiões, que têm acesso a medicamentos potentes, com isso, as pessoas de alto poder aquisitivo chegaram até a traficar receitas para obter a substância, isso fez os pacientes não se identificarem com problema e negarem a dependência.
O Brasil ainda está longe de um cenário como o americano. Aqui há dois lados para a questão: de um está a população mais pobre, que não recebe o tratamento efetivo para a dor e de outro uma parcela com maior poder aquisitivo que já registra o vício em opiáceos, como Tramadol e oxicodona. Para os médicos a solução é o controle e a cautela, que seria tirar os opióides do pronto-socorro e deixá-los apenas em clínicas especializadas.
- Érica Gregorio, jornalista, estudante de Sociologia, escreve periodicamente no seu blog ericagregorio.com