Parir e nascer no Brasil não é igual para todas
Hoje quero te contar alguns dados que merecem ser ouvidos com o coração e mente abertos. A Fiocruz divulgou os resultados preliminares da maior pesquisa sobre parto e nascimento no Brasil, feita entre 2020 e 2022 em hospitais públicos e mistos, vinculados ao SUS. Os números ainda são parciais, mas já escancaram desigualdades.
Dados do SIM (Sistema de Informação sobre Mortalidade) destacam que, entre 2015 e 2022, mulheres pretas tiveram duas vezes mais risco de morrer em comparação com mulheres brancas. E essa diferença se mantém neste estudo e acrescenta que se mantém também mesmo quando o estudo considera o nível de escolaridade. Ou seja: estudar mais não protege do racismo.
Para cada mulher branca que morre por complicações hipertensivas na gestação, parto ou puerpério, três mulheres pretas perdem a vida pela mesma causa. Elas também iniciam o pré-natal mais tarde, fazem menos consultas e visitam menos as maternidades onde vão parir.
Mesmo com avanços no direito a ter acompanhante, as poucas que ainda foram privadas desse direito eram, em sua maioria, pretas. E são também as que têm menos registros no prontuário — inclusive de algo básico, como o peso do bebê ao nascer. Isso mostra que o racismo não termina no parto: ele atravessa também o cuidado com o recém-nascido.
Esses números provam que não se trata de casos isolados. É um padrão estrutural. E se o racismo não nos atravessa diretamente, ele nos beneficia e essa vantagem tem um custo pago por outras mulheres.
O letramento racial é o convite para enxergar o que antes passava despercebido: o racismo nas lacunas, nos atrasos, nos silêncios, na assistência de baixa qualidade, na falta de atendimento, nos prontuários incompletos.
E eu te deixo a pergunta que ficou ecoando em mim:
Como nós, mulheres brancas, podemos ter práticas realmente antirracistas? Não como discurso bonito, mas como ação cotidiana, dentro dos consultórios, nas maternidades e nas nossas conversas? Porque parir e nascer no Brasil não é igual para todas.
Suellen Amaral
Psicóloga perinatal, Doula com ênfase em treinamento mental, representante Maio Furta-cor Salto/Itu e recente mãe do Rael Piiê
*Jornal de Itu é apoiador oficial do movimento Maio Furta-cor Salto/Itu
