Ituanos isolados ao redor do mundo

Ituanos ou ex-moradores de Itu que escolheram outras paisagens para viver contam, nesta reportagem exclusiva do Jornal de Itu, como seus países estão enfrentando a pandemia do Covid-19.

Multa de 300 euros

O casal Kate e Julio Savi mora em Hamburgo, na Alemanha. O isolamento durou cerca de sete semanas – começou na terceira semana de março. Neste período, só supermercados e farmácias ficaram abertos. O governo ajudou profissionais autônomos: 9 mil dólares para três meses.

“Houve fraude no sistema e muitos inscritos.  Nós somos professores, somos considerados autônomos e até hoje não recebemos nada e não sabemos o motivo”, lamenta Kate. Para empresas que deixaram os funcionários em casa, houve também uma ajuda. Mesmo assim, muitas empresas faliram. “O governo ficou com receio de ficar igual a Itália, a ponto de escolher quem usaria respiradores”, conta.

Ela diz que o Estado investiu em infraestrutura e até hotéis foram preparados para receber possíveis doentes. “As pessoas colaboraram com o pedido da Primeira Ministra Angela Merkel, e acho que isso ajudou bastante”.

Atualmente, a vida começa a voltar ao normal, mas com controle de distância. Exceção para piscinas e academias que permanecem fechadas. “Mas ainda precisamos usar máscaras em locais fechados: a multa é de mais de 300 euros (R$ 1.800,00)”.

Pub fechado e “sensação de Halls preto”

O arquiteto Mário André Giannetti Filho, 39 anos, mora há um ano e meio em Manchester, cidade ao Norte da Inglaterra. O Reino Unido (composto por Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte) é hoje um dos países mais afetados pelo Covid-19, sendo que, até  às 15h do dia 18 de maio, contabilizava 243 mil casos e 34.636 mortes. “Considerando as subnotificações, seriam mais de 2,5 milhões de pessoas infectadas”, explica Mário, que saiu de Itu com sua companheira Larissa Galdini.

O casal acredita que já teve a doença. Os sintomas foram diferentes: ele perdeu totalmente o olfato e paladar, teve tosse e dores musculares. Larissa foi praticamente assintomática. “Ela sentiu apenas a garganta raspando um pouco e uma impressão de refrescância quando respirava, sensação parecida com a de quando chupamos Halls preto, sintoma que eu tive também”. Eles não foram registrados com a doença e nem fizeram o teste pois a orientação é similar a do Brasil: ficar em casa e somente dirigir-se ao hospital caso passe a ter sintomas incapacitantes como falta de ar aguda, tosses muito fortes ou febres muito altas.

À princípio o Reino Unido tentou adotar uma estratégia “alternativa” e expor as pessoas à doença para que elas adquirissem imunidade. Logo constatou-se que foi uma péssima ideia e o número de casos disparou no país até o Primeiro Ministro, Boris Johnson, quase morrer com o Covid-19 ficando vários dias internado na UTI.

Inicialmente, apenas pessoas em cargos chaves estavam autorizadas a trabalhar para manter serviços essenciais funcionando. Os hotéis foram fechados e começaram a abrigar os moradores de ruas. Atualmente, o lockdown está começando a ser flexibilizado.

Nesse momento, as empresas estão autorizadas a reabrir, desde que obedeçam a normas. Festas, reuniões públicas e restaurantes continuam proibidos de abrir ao público. As escolas estão previstas para voltarem a funcionar no dia 01 de junho.

Para quem comprovar que está impedido de trabalhar devido à pandemia o governo concede um auxílio que vai de 600 a 2.500 Libras (valor entre R$ 4 mil a R$ 16 mil), de acordo com a média salarial comprovada antes do lockdown.

O advogado Ramon, 28 anos também escolheu a Inglaterra, no Reino Unido, como nova residência para ele e seu marido Gustavo, mas na cidade de Brighton.  

“O governo tem auxiliado com 80% do salário de todos aqueles que foram suspensos ou demitidos em função do Covid-19. A atual gestão até domingo (10/5) havia proibido qualquer contato, visita ou viagem que não fosse a trabalho e passeios que não fossem para exercício diário”, conta. “Atualmente continuamos com lojas, escolas, restaurantes e os famigerados PUBs, tão amados por aqui, fechados, e sem a menor previsão para reabertura”, lamenta. 

Estado de calamidade

A jovem Beatriz Medeiros de Siqueira, 25 anos, está em Lisboa há dois anos. Até a tarde de terça-feira, 19, a cidade tinha 1.496 infectados. No país eram quase 30 mil. Ela está em isolamento social há três meses e conta que o país já passou do ápice da pandemia e agora se encontra em “Estado de Calamidade”.   “Aqui tivemos providências tomadas a tempo para não expandir mais a pandemia, então agora algumas coisas estão reabrindo aos poucos e tentando manter todo cuidado”, diz.

O governo auxilia os trabalhadores e empresas com a Layoff (impede que a entidade desempregue a pessoa e a segurança social contribui no pagamento).  Em alguns casos, houve redução de emprego e corte de benefícios. 

Nível 4 de lockdown

Francielle Dias, 27 anos, mora em Auckland, Nova Zelândia, a quase três anos, junto com seu marido Moises e o casal de filhos. Em meados de fevereiro o país confirmou alguns casos, quando começou a conscientização sobre a importância do distanciamento social e higienização. “Porém, os números começaram a crescer drasticamente, e o governo impôs medidas mais rígidas a partir do dia 25 de marco e todo o pais entrou em alerta nível 4 de lockdown, inicialmente por quatro semanas. Apenas serviços essenciais estavam liberados para funcionar, seguindo medidas rigorosas de segurança e higiene”, narra a jovem.

Desde o pronunciamento os trabalhadores registrados ou autônomos passaram a receber um auxilio emergencial semanal. O governo realizou testes em massa em pontos estratégicos como um “drive-thru” para aqueles que apresentavam sintomas do vírus.

“O policiamento local aumentou e a população se empenhou para manter a ordem, vigiando e denunciando qualquer situação que saísse do permitido. O retorno foi grande e rápido, depois de quatro semanas em isolamento total os números de casos havia diminuído e o ápice da pandemia já havia passado”, fala.

 Porém, mesmo após o ápice, os testes continuaram e o governo incentivou a população que apresentasse sintomas simples como dor de garganta a fazer a testagem. Foram  então para o nível 3 com apenas algumas categorias de trabalho permitidas a retornar. Após duas semanas, e sem haver aumento de casos, mudou-se para o nível 2 , atualmente, com escolas voltando a funcionar e a maioria das empresas. Com uma população de aproximadamente 5 milhões de habitantes a Nova Zelândia registrou 1.503 casos, 21 mortes e 4 casos ativos (até a terça-feira, 19 de maio).

Aplicativo da polícia e luto

A comissária de bordo Bruna Bragagnolo, 27 anos, mora em Dubai – Emirados Árabes Unidos há 5 anos e meio. Desde meados de março o uso de máscaras tornou-se obrigatório e quem não respeita a lei está sujeito a multa de aproximadamente R$1.600.

“O lockdown começou por volta do mesmo período e tivemos um mês e meio de muita restrição. A polícia criou um aplicativo onde as pessoas tinham que pedir permissão pra sair de casa, por no máximo 3 horas. Todas as vezes tínhamos que colocar o endereço residencial e o endereço de onde pretendíamos ir (as opções eram somente farmácia, hospital, supermercado ou, no caso de uma emergência, explicar o motivo). Enviávamos o pedido e a polícia nos respondia em alguns minutos se podíamos ou não sair de casa. Quem andasse na rua sem a permissão, era multado e podia chegar a ser preso”, conta.

Todos os shoppings, praias, hotéis, academias, piscinas, restaurantes foram fechados desde o princípio. Muitas pessoas perderam o emprego e foram repatriados. A maioria dos que permaneceram tiveram os salários reduzidos em pelo menos 25%.  Não existe nenhum auxílio governamental. “Meu marido não parou de trabalhar, mas eu parei desde o início”, elucida a jovem.

Há 20 dias o país reabriu, aos poucos. Shoppings, restaurantes e hotéis podem receber no máximo 30% da capacidade e na entrada medem a temperatura das pessoas. “Agora não é mais necessário o uso do App da polícia para sair de casa, mas não podemos estar nas ruas à partir das 22h até as 6h, porque o governo continua desinfectando a cidade”, explica ela. O total de casos na cidade, até terça-feira, 19, era de 23.358, com 220 mortes.

Bruna passou por uma situação muito triste devido à pandemia: sua mãe faleceu em Itu, em abril, mas ela não pôde vir vê-la. “Se eu fosse em um voo que encontrei, de repatriação, eu não poderia mais voltar. Apesar de morar aqui, por não ser nativa, não iria poder entrar no país novamente”, lamenta.

SPA, fogueira e 32 mil reais

Os irmãos Nathalia, 29 anos, e Guilherme, 33 anos, estão  no Canadá há um ano. Foi decretado o isolamento social a partir de 16 de março. Os dois pararam de trabalhar desde então e sobrevivem graças  a um auxílio emergencial do governo, equivalente a mais ou menos 1,5 salário mínimo do país: cerca de 2000 dólares canadenses por quatro meses: total de 31,5 mil reais.

Na província onde eles moram, em Winnipeg,  houve até quarta-feira, 20, 290 casos e 7 mortes. Pelo fato de a situação estar sob controle, foi iniciada uma reabertura gradual. Há duas semanas permitiu-se que abram restaurantes que têm pátio externo, dentistas, fisioterapeutas, massagistas etc., porém, com novas regras e capacidade reduzida. Muitos lugares, mesmo com a permissão de abertura, escolheram ainda não reabrir, por cautela. “O spa onde trabalho reabrirá apenas no início de junho”, explica Nathália.

“O período de isolamento coincidiu com o início da primavera, que, após seis meses de gelo, foi muito bem recebida. Enquanto a orientação era ficarmos isolados em casa, fizemos muitas fogueiras no nosso quintal e até chegamos a ir acampar e fazer fogueira, pois isso já está permitido”, finaliza.

Vá para casa e tome um chá

Flávia Gardiman está com o marido e a filha Alice na cidade de Rotterdam, na Holanda. Saíram do Brasil há um ano.  O marido trabalha home office desde que foi decretado pandemia no país, em março, e deve ser assim até setembro. “Conhecemos várias pessoas que perderam o emprego devido a situação”, lamenta.

As ações são similares as do Brasil: nos mercados e lojas eles já deixam disponível álcool gel na entrada para passar nas mãos, cestas e carrinhos de compra. No chão tem demarcação para ficar na fila e corredores.

Há ainda outras questões parecidas. “Na parte do atendimento médico, sabemos que muitas pessoas pegaram o vírus mas não foram diagnosticadas, ou fizeram o teste mas foram mandadas de volta para casa. Aqui é comum os médicos mandarem você voltar para casa, tomar paracetamol, chá e descansar até o corpo reagir para a maioria das situações. Aparentemente, com o corona isso não foi muito diferente”, diz.

A cidade, atualmente, está voltando ao normal após a quarentena. A menina Alice vai apenas dois dias para a escola e o resto das aulas são on-line.  As máscaras são exigidas apenas em transporte público e do resto vale as regras de higiene e distanciamento. E a família torce para tudo voltar ao normal…

(Fotos: Arquivo Pessoal/ Texto: Rosana Bueno/Jornal de Itu – Proibida a reprodução)

*Este texto foi revisado no dia 24, às 22h, para correções gramaticais. Pedimos desculpas a quem leu uma versão anterior, com alguns erros.

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