NÃO AO ROL TAXATIVO! PELA MANUTENÇÃO DOS DIREITOS DOS USUÁRIOS DE PLANOS DE SAÚDE

  • GRAZIELA COSTA LEITE 

Eu sou mais uma mãe atípica e guerreira deste Brasil: tenho um filho raro, acometido por uma doença grave e degenerativa. Imagine que todos os dias penso como será o futuro do meu filho com suas limitações impostas pela sua doença.  Meu filho realiza terapias diariamente e que serão para o resto de sua vida. Ele precisa dos melhores e mais avançados métodos de terapias e os mais novos recursos da ciência e da medicina para mantê-lo vivo.

Fiz da luta do meu filho, uma luta coletiva para outras crianças, e por isso, hoje eu luto por todas as mães atípicas, não meço esforços para lutar todos os dias pelo bem-estar do meu filho, assim como auxiliar outras mães a manterem a força para lutarem continuamente pela qualidade de vida dos seus filhos.

Algumas mães eu conheço pessoalmente, outras apenas online, umas através do telefone, outras nunca trocamos uma só palavra…. Mas temos algo em comum: SOMOS MÃES.

E por isso tenho atribuição para apresentar esta CARTA ABERTA de mãe, e clamar aos Ministros da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que não limitem o direito à vida dos filhos do Brasil. Clamamos aos Ministros que, ao julgarem no dia 08 de junho os Embargos de Divergência RESP 1886929 – SP (2020/01916776) e RESP 1889704 – SP (2020/0207060-5), apliquem os princípios e direitos fundamentais à vida digna, e que seja priorizado o direito do hipossuficiente, paciente consumidor, portanto, julgar em favor das empresas de plano de saúde é vedar o direito à vida dos brasileiros.

Como consumidora e representante de milhares de outros pacientes que fazem uso do plano de saúde, e possuem ordem judicial para a realização de tratamento terapêutico, tratamento medicamentoso, cirúrgico e quimioterápico, espero que não limitem o Rol de procedimentos da ANS. Hoje o entendimento jurídico do rol de procedimentos é exemplificativo, assim a prioridade é a prescrição médica, o tratamento necessário e adequado indicado pelo médico responsável pelo paciente.

Caso seja sedimentado o entendimento de que o rol de cobertura da ANS deva ser taxativo, todos os usuários de planos de saúde correm o risco de perder a oportunidade de recorrer ao plano quando necessitarem, os médicos não irão prescrever tratamentos que não estejam no rol, a ciência irá perder espaço para burocracia e a vida humana deixará de ser prioridade, sendo priorizada a questão econômica, pois todo tratamento novo e de alto custo certamente não estará no rol taxativo.

Assim os consumidores serão as vítimas do engessamento da saúde privada e os desembargadores serão os responsáveis por essa catástrofe jurídica social na Saúde.

Em torno de 25% da população brasileira é usuária da Saúde Suplementar, sendo que 75% da população brasileira utiliza o SUS. Com a limitação de tratamentos pelo rol taxativo, consequentemente haverá remanejamento para o SUS, sobrecarregando-o ainda mais, e impactando na economia do Estado. Muitos usuários vão deixar de pagar os planos de saúde pela insegurança de fato, ficarão na dúvida se haverá assistência à saúde quando houver a necessidade.

Não é responsabilidade do Colegiado do STJ legislar sobre a manutenção do rol exemplificativo, portanto não deveria analisar esse mérito. Caso haja o prosseguimento deste erro em uniformizar o entendimento pelo rol taxativo, quem irá assistir os Autistas – Diabéticos – Cardiopatas – Gestantes – Deficientes Físicos – Pessoas com Câncer – Pessoas com Alzheimer – Doentes Raros – Vítimas de Acidentes – Pacientes que dependem de home care e outros inúmeros usuários e necessitados de tratamento médico em suas diversas esferas?

É por isso que, definitivamente, o rol taxativo mata!

Cerca de 4 mil procedimentos estão listados no rol da ANS e mais de 9 mil doenças constam na catalogação no rol da ANS. Se nota o impacto desastroso que eventual decisão poderá acarretar à vida de milhões de brasileiros.

Com efeito, ao interpretar o rol como taxativo, o que se estaria chancelando é a lesão ao consumidor, ao meu filho, assim como milhões de filhos brasileiros, permitindo às empresas operadoras de planos de saúde, ou seja, instituições privadas, privilégios em detrimento à necessidade real do povo.

Ou seja, em termos práticos, as operadoras de saúde, que já lucram bilhões por ano, por questões estritamente econômico-financeiras, apoiam a definição do referido rol como “taxativo”, EM DETRIMENTO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA PESSOA HUMANA, previsto no art. 6º da Constituição Federal Brasileira, como sendo um direito social.

Art. 6º “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. (g.n.)

Impõe-se destacar que a prestação de serviço de saúde é, em princípio, um dever do Estado (CF, artigo 196), mas que, ante a falta de preparo do Poder Público para exercer esta função, foi assumida por empresas privadas, atraídas pela alta lucratividade que essa atividade oferece, por meios dos planos de saúde.

Trata-se, pois, de evidente afronta ao Código de Defesa do Consumidor, impondo-se contraprestações manifesta e excessivamente exageradas ao beneficiário do plano de saúde, enquanto referidas empresas, ano a ano, continuam a aumentar seu lucro.

A “taxatividade” do rol da ANS não lesará tão somente o consumidor, notadamente os portadores de doenças graves, submetidos à desvantagem exagerada por cláusulas contratuais iníquas e omissas de boa-fé, mas há de ferir, também, a própria segurança jurídica que sustenta o Estado Democrático de Direito.

CF/88, art. 1º: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

          (…)          III – a dignidade da pessoa humana;”.

Ademais, a relação de consumo entre as operadoras de planos de saúde e os beneficiários foi chancelada pela Súmula 608 do próprio STJ, de maneira que, dada a hipossuficiência do consumidor, devem ser as normas interpretadas em seu favor.

É certo que, nos termos do artigo 51, inciso IV, e § 1º, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor, são nulas, de pleno direito, as cláusulas contratuais que colocam o beneficiário consumidor em uma desvantagem exagerada ao restringir seu direito de receber o tratamento adequado e prescrito à doença coberta pelo plano de saúde, direito subjetivo intrínseco que decorre da própria natureza do contrato firmado com as operadoras de planos de saúde.

Nesse sentido, a jurisprudência vem assinalando que a nulidade das cláusulas limitativas do tratamento de doenças cobertas pelos planos é evidente, “diante da ofensa à própria garantia de saúde que concede, sendo incompatível, inclusive, com a boa-fé objetiva e, especialmente, com a função social do contrato firmado pelas partes.”

Isto posto, requeiro como mãe, consumidora, cidadã brasileira e defensora dos direitos sociais e pela dignidade da pessoa humana, e pela presente carta manifesto o desejo de todos os usuários de planos de saúde, especialmente as pessoas que estão em tratamento médico, terapêutico e medicamentoso, que a tese fixada, caso seja levado adiante o julgamento, seja pela repercussão geral de se reconhecer e definir o rol da ANS como no mínimo EXEMPLIFICATIVO para favorecer sempre os consumidores para manutenção da VIDA!

(Carta Aberta enviada à Brasília)

  • GRAZIELA COSTA LEITE  – mãe, ativista, cidadã brasileira e consumidora de plano de saúde

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