Por que estamos falando em reabertura?

De acordo com o InfoGripe, banco de dados da Fiocruz, na semana epidemiológica 21 (entre 17 e 23 de Maio), houve 12460 casos de internação por síndrome respiratória aguda grave no país. Dessas, 2254 foram diagnosticadas como COVID19 e 3 como gripe. As 10203 internações restantes não têm diagnóstico ainda. As diagnosticadas são aquelas que entram na conta dos números que você vê todo dia no jornal. As demais ainda não estão lá. Ou seja, 81% não está contabilizado em lugar nenhum e é cerca de 8 vezes a média dos anos anteriores.

Em questão de óbitos, o dado também assusta. Apenas para a semana 21, foram 775, com 216 diagnosticados como COVID19, nenhum pra gripe, e todo o restante  aguardando exame. A média dos anos anteriores fica em torno de 150 mortes. 72% das mortes da semana 21 não foram diagnosticadas, não entraram em dados oficiais ainda, e o número é cinco vezes mais alto que o normal.

Colocando de forma simples: os números de casos e mortes que você vê todos os dias nos jornais é apenas cerca de 25% do total.

Os mais de 400 mil casos confirmados? 20% do total. As 27 mil mortes? Podem estar na casa dos 100 mil. 50 mil se formos muito otimistas. E se passaram menos de quatro meses desde o primeiro caso confirmado.

Sabendo então que a subnotificação aponta para um número de casos e mortes que pode ser até sete vezes mais alto que o oficial, com uma quantidade de mortos esperando diagnóstico que supera em muito o número de mortos diagnosticados, fica aí a dúvida: por quê estamos falando em reabertura?

A reabertura do comércio é a recompensa pela diminuição da crise. Nós fechamos porque estávamos tentando controlar o contágio. É pra isso que a quarentena existe, e ela dura até que o pico passe e a doença seja controlada. Quarentena não é férias. Mas nós tivemos um cabo de guerra desde o começo. De um lado, gente falando pra fechar. Do outro, gente dizendo que não podia fechar. Com isso, a quarentena nunca foi real. Ela fechou comércio e não reduziu contágio. Causou desemprego e não impediu colapso do sistema de saúde. Achar que quarentena é questão de opinião tornou a medida de instalá-la inútil. Então não tivemos isolamento de 70% nem redução no ritmo de contágio. Os dados oficiais já são suficientes para mostrar isso e são apenas a ponta do iceberg.

Mas estamos falando em reabertura. Não houve fechamento de fato, não houve isolamento, não houve redução, não passamos pelo pico, mas estamos falando em reabertura. Não fizemos o mínimo e queremos a recompensa. Por quê então fechar quando estávamos nas centenas de casos, e reabrir quando estamos nas centenas de milhares, em ritmo ainda mais acelerado de crescimento?

Fechar não é optar por salvar vidas e abrir mão de empregos. Fechar é salvar vidas e reduzir a perda econômica – que ia e vai acontecer, porque é assim que funciona uma pandemia. Reabrir não é salvar empregos e arriscar algumas vidas. Reabrir é arriscar centenas de milhares de vidas, a certeza do desemprego e uma crise econômica de anos, além de só adiar um lockdown completo. A pandemia não vai embora sozinha. Enquanto o isolamento não acontecer, ela se mantém.

Mas o cabo de guerra continua. Gente puxando de um lado para manter a quarentena e gente do outro gritando que o Brasil não pode parar, achando que tudo é uma questão de opinião. Mas o vírus não liga. O vírus não se importa com o cabo de guerra porque ele sabe que ninguém vence, a corda estoura para ambos.

  • Ana Luiza Savioli da Silva é ituana,  formada em Biologia pela Unicamp

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